segunda-feira, 8 de março de 2010

Nas Asas do Desejo



O ar rarefeito da montanha corta-me, aos poucos, a respiração. Ofegando, trepo pelas rochas, com as mãos em chaga. Tão frágil, tão lamacenta, a terra se desfaz por entre os dedos e por cada centímetro que subo, caio meio. O tempo passa tão devagar quando olho para cima e o céu parece sempre tão longe. Onde está a luz? Que a chama em mim teima em apagar-se...

Não acreditei quando a caminhada acabou. Deitei-me, encolhi-me e cedi à exaustão. Dias depois, acordo, numa poça de suor. O sol brilha lá no alto e olhos ardem como se estivesse a ver pela primeira vez. Vales e vales, uma cordilheira de montanhas, centenas de picos, planaltos e escarpas, se estendem a perder de vista. O horizonte, perscrutava-me transfixo, para onde quer que me voltasse.

Num momento a vida muda, todos os planos, todo o crer desaparece nesse instante. O mundo reduz-nos à nossa insignificância e deixa-nos prostrados no mesmo chão duro que tememos até então. Rezei, pedi e tentei legitimar esse desejo, que persegui durante anos. Agora já não faz sentido... perdi-me nessa imensidão.

E desfeito, pedi-te. Implorei-te por ajuda, por orientação. Envergonhei-me da minha ilusão e escolhi a tua: "Ajuda-me Senhor, mostra-me o caminho porque estou perdido. Se é isso o melhor para mim não me deixes parar agora, dá-me força, dá-me asas".

O sol apagou-se e no escuro brilhei com a luminescência de mil centelhas. Como um Deus menor, olhei para as trevas e avancei sem medo. A minha vontade iria prevalecer... foi essa a tua ilusão, porque, me atirei para o abismo do meu desespero. A subida, que fiz a tanto custo, pareciam escassos metros na queda.

O que custa mais quando o fim é eminente? Fica a inconformidade por algo que desejamos com todos os poros e nos é vedado, não por vontade de outrem, mas por incompetência nossa. Minha. Desejava agora mais que nunca, encontrava conforto no sonho impossível, via-o diante dos olhos. Ignorando o ar gélido da descida, a força avassaladora da gravidade e o racional, cresci as asas e voltei a erguer-me em altitude. Elas guiaram-me até ti...

...mas acordo, num movimento perpétuo e mecânico, levanto o braço dorido e alcanço a rocha. A caminhada continua.

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