quinta-feira, 29 de julho de 2010

Austrália


Descobri o calor debaixo do sol ardente,
do outro lado do mundo nessa terra nua e selvagem como a serpente.

O dia ergue-se sem pejo sobre uma linha verde e sente-se vida a ofegar no seio da floresta,
levada nos braços da montanha à garganta do oceano fluindo por uma fresta,

Passam anos por riachos e ribeiros em dias de monção,
quais aguaceiros alheios a um sem fim de Verão.

Uma gruta escondida atrás da sua nascente perdida,
desce a uma praia deserta,
banhando o horizonte até onde o grande coral desperta.

Quero provar o sal da alma neste fugaz paraíso,
sonhando para me encontrar num interminável sorriso,
onde o murmúrio do ocaso é o doce soçobrar de tardes sem igual,
segredando pelo céu o caminho ao mistral.

Esqueci na noite densa,
libertando-me da minha pertença,
pois foi este solo que me cultivou de passagem,
suave e sem pressa, porque a vida é uma viagem,
a que quis fazer,
navegando, Austrália, para te ver.

Aos
navegadores portugueses que em 1606 reconheceram a existência deste continente,
Luís Vaz Torres e Pedro Fernandes de Queirós.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Viajando em Ti


Se a vida fosse uma estrada molhada patinavas para os meus braços?

O negro alcatrão escorrega aquoso como o leviano prazer da tua companhia, pois o fim anunciado da nossa não tão inocente jornada é apenas o pêndulo, deste relógio sem horas nem descanso.

Se ao menos lêssemos os sinais... um código demasiado complexo para onde vamos, desregrando tudo o que um dia queríamos ser.

O que achas que acontecerá quando já não pudermos dizer o que realmente pensamos?

Quando ao cruzar de um olhar descobrimos que fomos longe demais. Seria como mentir, ao não confessar o ciúme do tipo que te guia. No entanto, nessa estrada basta um ligeiro desvio para mudares de via.

Ou não. E seremos estranhos passageiros do óbvio, numa viagem sem curvas nem destreza, até finalmente desaparecermos no horizonte. Não, nada disso.

Fala-me do que te move, não te permitas insultar a inteligência, espera até saires fora de alcance e deixa-me perseguir-te, pela estrada fora.

terça-feira, 20 de julho de 2010

O Nosso Exílio


Queda-se imóvel o olhar...
Sinto-me enternecer nas tuas palavras, o seu som levado no vento por janelas abertas.
Aquelas que não voltarás a proferir, pois sabemo-las pairando sobre o dossel,
ecoando todos esses tempos mudos.
Colhendo-nos do mundo, para qualquer lugar... Onde te adormeço em doces cantigas de outro cantar e, quem sabe, no beijo que já não te posso negar.
Preciso de ti agora rendida num suspiro... onde mais podemos ser nós?
Quero perder-te a vista atrás das cortinas, onde só o sol e a brisa podem entrar.
Ver-te no espelho onde as sombras são o nosso complementar.
Tu eras luz sem brilhar, nos dias do meu acordar.
Imutável fiquei, no teu remoinho de mudança, perdido nas conversas de outrora e encadeado pela alba da temperança.

Queda-se imóvel o olhar...
Sinto-te a desaparecer das minhas memórias, a tua visão pelo postigo.
Daquela porta por onde não voltarás comigo. Lá fora a chuva cai na alma, sem abrigo.
Rendendo um suspiro sem sentido... onde já há muito fomos nós.
Retiraste-te sem ceder, sem medo, com tudo para perder.
Dançam as cortinas e o espelho mostra o vazio do meu adormecer.
Inabalável serei, no meu oceano de esperança, deambulando pelo soturno anoitecer da vingança.