segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O rio de sangue

Perder o temperamento nunca fica bem a um homem bom...
"Não, deixa a curva voltar".
Vê-se o calculismo das pessoas nessas alturas. Conhecemos-nos na tensão e quando cada partícula clama por violência.
"Sim, cede à justiça sangrenta. Agarra-os pela jugular e rasga-os da mentira. Olha para o sangue a jorrar... que visão irónica, pois quem derramou o primeiro sangue foram eles. No seu contínuo embuste. Matai-os a todos! Pois te ordeno".
A sombra da traição é implacável quando cai sobre o homem justo. O ridículo usa muitas faces e muitas vezes o ridicularizado jaz caído na lama, cobrindo o semblante. Não que exista maior gáudio para os fracos de espírito do que a queda de quem se tenta, desesperadamente, manter de pé. A face de quem se recusa a mergulhar na ignomínia não será encoberta e desfaz até o mais cínico dos falsos.
"Cometeste um erro. A humanidade não merece o teu lado humano. Voaste para lá do sol antes do tempo. Não te deixes condenar ao esquecimento, alheio à tua própria natureza. Ordeno-te o assassínio. Eles são um exíguo sacrifício ao Minotauro. Ordena-te ao assassínio. A besta o exige. O nono círculo do Inferno se reserva aos traidores."
E assim, termina uma odisseia malévola, com o abandono de tudo o que é bom e puro, dando lugar à tormenta na costa tranquila. No entanto, não estaria certo roubar água ao Oceano, pois que para esses há, de facto, mais terra que mar...

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Canção do Caos


Chaos often breeds life, when order breeds habit - Henry Adams

Do alto das tuas muralhas me observas cá em baixo, onde te aguardo no abismo da luz,

Entre reflexos de incandescências voando em espiral. O vento é negro e encandeia-te o olhar, desfazendo-se em brumas... sequioso o soturno respirar te envolve a índole,

Ouve o trote do meu áureo corcel.

"Acorda do teu transe e sopra o escuro até ao luar": ressoam os passos deste hipnótico cavalgar.

Conversando sem sentir não irás longe.

"Acorda e deixa-te viver", sentindo na minha fala um brilhante sibilar... vem comigo nesta estrada de nebulosa,

Anda... sem recear.

"Acorda neste celeste despertar"... Escorrega para a espiral e balança o meu eixo, sacode as fundações do teu soturno cativeiro...

Cura o sono e deixa a febre assomar.

Na companhia da morte passam Éons em minutos, foge da prisão astral, encontra em mim a tua força vital, e subiremos juntos este eterno rio de luz.

Há espaço na esperança para nós: púrpura, vermelho, carmesim até acenderes a chama - Há tempo na ventura para nós: negro, cinzento e branco respiras ao nos desfazermos no ar.

Somos absoluto no relativo, pairando sem gravidade, numa pureza sem sentido. Uma luz no universo, tu és o calor no meu peito e eu o espelho do teu acordar. Unos estaremos enquanto o destino nos quiser separar. Morremos para viver, renascendo numa ideia em que sonhamos estar.